A alimentação materna causa cólicas no bebê?

A alimentação materna causa cólicas no bebê?

Quase todos os dias eu respondo a perguntas sobre as possíveis causas de cólicas no recém-nascido provenientes da alimentação da mãe. Por várias vezes as mães dizem ter certeza de que foi determinado alimento e passam a excluir esse alimento de suas dietas. Por outras, são os parentes/amigos que recomendam restringir a alimentação para não causar cólicas no bebê.

Vários vão para a berlinda nessa história: feijão, repolho, chocolate, café…

Constipação nos bebês também é outra causa de preocupação que geralmente faz com que as mães comam determinados alimentos para tentar aliviar. Ameixa, mamão, aveia, farelo de trigo… Fora os chás para tentar melhorar o sono dos bebês.

Mas afinal, essas coisas passam pro leite?

Vamos começar falando do intestino

Órgão maravilhoso, de rara inteligência, resistente, coitado, ao bombardeio diário desse nosso estilo de vida moderno. Resumindo de forma bem simples, absorve o que pode, elimina o que não pode ou não foi digerido adequadamente. Muitos compostos não digeríveis são fermentados pelas bactérias lá presentes e geram gases. Esses compostos, por não serem quebrados em partículas menores, não têm como ser absorvidos e são eliminados pelas fezes. Ou seja, entram quase da mesma forma que saem, sem alcançar a corrente sanguínea.

Feijão e repolho são vilões causadores de cólicas?

Os componentes causadores de gases presentes nos feijões são carboidratos que não são quebrados pela nossa digestão, fermentam, causam gases e depois vão embora privada abaixo.

O repolho (e outros crucíferos, como a couve-flor, a couve, o brócolis) também tem alguns carboidratos desse tipo, além de compostos sulfurados (que contém enxofre) e, além de causarem gases, conferem aquele \”aroma\” característico a eles, vulgo cheiro de mangue. Quem nunca, né? Então, raciocinem comigo: se os compostos responsáveis pelos gases não alcançam a corrente sanguínea, como eles poderiam chegar ao leite materno?

Pois é, eles não chegam lá. Ou seja, feijões e crucíferos ingeridos pela mãe não causam gases no bebê.

Mas e a mãe comer mamão e a ameixa para evitar constipação no bebê?

Os compostos presentes no mamão, que podem ajudar na digestão e na peristalse intestinal (movimentação que encaminha o bolo alimentar/fecal ao seu destino inevitável), são basicamente enzimas. Enzimas são compostos proteicos que atuam localmente no intestino. Para serem absorvidos, precisam ser quebrados em partículas menores, processo que os descaracteriza, fazendo com que deixem de ser enzimas. Deixando de ser enzimas, perdem suas propriedades. Chegam ao sangue como proteínas genéricas (aminoácidos) e não têm como ter efeito algum no bebê amamentado.

A ameixa contém alguns carboidratos não absorvíveis (fibras e polióis). No intestino, eles tendem a juntar água ao bolo fecal por osmose, aumentando seu volume, o que, por sua vez, estimula os movimentos peristálticos.

 Como não são absorvíveis, esses carboidratos não alcançam a corrente sanguínea e muito menos o leite materno. Aveia e farelos (de trigo, de aveia…) contém fibras solúveis e insolúveis que também não são absorvidas e não passam pro sangue. Consequentemente não há como passarem pro leite materno.

Conclusão: a mãe comer mamão, ameixa e farelos não evita ou alivia quadros de constipação no bebê exclusivamente amamentado.

Sobre o chocolate, há outras coisas envolvidas

Temos a proteína do leite presente em sua composição, que pode causar reação em bebês alérgicos a leite. Se o bebê não for alérgico, zero problema quanto a isso.

Mas o chocolate também tem um pouco de cafeína e teobromina, estimulantes que podem passar um pouquinho(inho) para o leite. Ou seja, dificilmente foi o pedacinho de chocolate que você comeu de sobremesa o causador das cólicas/falta de sono/irritabilidade do seu bebê não alérgico a leite.

E o que dizer do café?

Sabendo que a cafeína pode passar um pouquinho(inho) pro leite, não convém abusar. O que seria abusar? 8, 9, 10 cafezinhos por dia talvez… Uns 2 ou 3 dificilmente farão mal. Nessa categoria entram também o chá preto e o mate. Moderação é a palavra: não precisa excluir, mas também não precisa nadar numa piscina de mate diariamente.

A mãe tomar chá de camomila acalma o bebê?

Aí vem aquela tia da prima da vizinha da sua amiga falar que a mãe deve tomar chá de camomila pra ajudar o bebê a dormir.

Olha, eu pesquisei. Pesquisei mesmo. As evidências de que a camomila tem de fato algum efeito sedativo sobre quem toma seu chá já são fracas e inconsistentes. Se esse delicado princípio ativo passar ileso por todo metabolismo da mãe e for parar no leite materno nós poderíamos chamá-lo de MacGyver.

Mas então, se nada disso adianta pra aliviar as cólicas do bebê, melhorar o sono do bebê, evitar a irritabilidade do bebê, o que eu faço???

Peito: o seu maior aliado contra as cólicas

  • Peito acalma mais que qualquer camomila.
  • Mamar leite materno ajuda no amadurecimento do aparelho digestivo e coloniza o intestino grosso com boas bactérias.
  • Bebês com mais de 1 mês amamentados exclusivamente, ganhando peso e fazendo xixi normalmente, podem passar até uma semana (alguns dizem até 10 dias) sem evacuar sem que isso seja um problema.
  • A tal da cólica nem sempre é um fenômeno puramente intestinal. O desconforto e irritabilidade do bebê podem ser causados por hiper-estímulo, como ambientes muito barulhentos, passar no colo de uma infinidade de parentes, muita luz, muita coisa acontecendo. Ou seja, lugares tranquilos, sem muita luz, sem barulho, colo da mãe, contato pele a pele, banho agarradinho com a mãe/pai ajudam muito.

E pode seguir feliz comendo seu feijão e tomando seu cafezinho.

[Leia mais em: Cólica do Bebê: Entenda Porque a Amamentação é Sua Aliada e Cólica do Bebê: A Controvérsia.]

[Para se aprofundar no tema, assista a nossa live ou ouça o nosso podcast sobre Cólica do Bebê: Preciso Medicar?]


Texto de Joana Adnet, mãe da Cecília e do Antonio, Nutricionista e Consultora de amamentação.

Você pode acompanhar o seu trabalho através da sua página no Facebook NutriJow e do seu perfil no Instagram @nutrijow.

Texto originalmente publicado em sua página do Facebook em 11 de agosto de 2017 e gentilmente cedido pela autora para divulgação por este meio.

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